Disse ele: “A monja gosta de política.”
O que me chamou a atenção foi gosta de política…
Será que eu gosto de política? Passei a me perguntar.
Gostar de política não tem sido a motivação para eu entender um pouquinho de política. E o que é entender um pouquinho de política? Para mim, inicia em compreender minimamente a ideologia por trás de partido A,B, C ou D. Sabendo a ideologia que sustenta tal agremiação, posso perceber qual a mentalidade que move determinado grupo e o que isto representa para a vida em sociedade quando tal partido ascende o poder. O que representa para o dia a dia do viver Polis. Nesse sentido, diferenciar entre programas de governos de esquerda e de direita ainda faz muita diferença, principalmente num país como o Brasil, um dos mais desiguais e injustos do mundo. Um país que não pode se dar ao luxo de dispensar a presença do estado para mediar e promover o bem estar social.
Assim, já vou adiantando, eu não gosto de política, eu necessito entender minimamente de política para compreender o mundo, entender a história da civilização e o porquê das coisas serem do jeito que são. Essa compreensão também se faz necessária na medida que sou psicóloga e religiosa budista – ambos campos comprometidos com a ampliação da consciência e diminuição da ignorância e alienação.
Tanto para psicanálise quanto para o Budismo, o desafio tem sido ampliar a consciência, a sabedoria e o auto-conhecimento. Buda, em seus últimos ensinamentos antes de morrer, há 2600 anos atrás, disse que entre todas as coisas refinadas, a tecedura da consciência é a melhor de todas. Buda foi um nobre, um príncipe de um reino chamado Shakya. Mesmo assim ele recomendava seus discípulos para não criar relacionamentos íntimos com nobres e poderosos. Buda porém, relacionava-se com nobres e reis, alguns inclusive discípulos seus e, sempre que tinha oportunidade lembrava a estes nobres o compromisso deles com o bem estar do povo.
Desde 2013 o cenário político do país tem sido palco das mais diversas manobras, culminando no golpe de 2016. Isso nunca foi novidade num país que tem histórico de acordos nacionais entre as oligarquia e as instituições que as representam. Ao longo de nossa história tivemos as invasões pelos colonizadores com toda a sorte de saques e devastação dos povos originários, depois tivemos 3 séculos de escravidão, depois a “independência” e a nova república. Ou seja, nossas matrizes fundantes nunca foram favoráveis e de boas intenções. O povo nunca foi realmente amado e cuidado, servindo somente como mão de obra barata, quando não escrava. Não foi necessário guerras para se apropriarem dos espólios provenientes de sucessivos saques de nossas riquezas. Tudo isso se transforma em poderosos obstáculos a serem superados, o que exige um tempo histórico maior e conhecimento dessa história. Para transformar o presente é necessário olhar para o retrovisor e, distanciados suficientemente, entender a história a partir das memórias do passado, para não continuar se repetindo numa eterna compulsão a repetição, como diz a psicanálise, ou no eterno ciclo do sofrimento de nascer e morrer, como diz o Budismo.
Para mim, história e política são inseparáveis e estão intimamente relacionados. Porém, por termos uma mente discriminadora, facilmente interpretamos a realidade de forma binária. Mas o que isso tem a ver com religiosos que emitem opiniões sobre os desdobramentos políticos da sociedade que estão inseridos? Não é incomum esses receberem críticas por isto. Há quem tenha desenvolvido aversão por políticos e política pois associam com corrupção. Lamentável e perigoso pois deixa o campo livre para toda sorte de oportunismo. Há quem considere o espaço político algo impuro e profano. Então a lógica é que religiosos se ocupem somente das questões espirituais e de amor ao sagrado, à pureza do espírito . Porém, o sagrado e o profano coabitam num mesmo plano.
Um antigo sutra budista diz que a observância do Darma(Lei Verdadeira) é a mais importante força para o progresso material e moral da humanidade. O nome desse Sutra é O Rugir do Leão sobre o Giro da Roda e mostra, entre outras coisas, como a prosperidade ou declínio de uma sociedade depende em grande parte das políticas adotadas pelos governantes. Em outro texto, Buda diz que quando os governantes são fracos, os bandidos são fortes, e ninguém está seguro, mas quando os governantes são fortes, os bandidos são fracos, e há segurança para todos.
Ensinamentos do Buda – Uma antologia ao Cânone Páli, Nissim Cohen – Devir Livraria – São Paulo, 2008.
Atualmente defendo que a melhor forma de amor e de caridade deve ser defender a justiça social através de políticas públicas. É o amor fraterno como método político. Esse amor se realiza no espaço público, através do espaço político, seu vetor.
Este seria o espaço de atuação que sustenta o amor ao próximo e a máxima de ouro se faria: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei!